Questões ambientais esbaram construção da FAP

A paralisação das obras da Faculdade Antônio Prado pelo Ministério Público vem dividindo as opiniões. Alguns a favor, outros contra a construção do empreendimento no terreno na Rua Vitor Grazziotin. 
Desde março a obra está parada devido a uma ação civil do MP. Como veículo de comunicação, procuramos o Promotor Público Dr. Stéfano Lobato Kaltbach. O primeiro contato foi por e-mail, mas na tarde desta quinta-feira, 03 de maio, conversamos pessoalmente sobre o assunto, junto à promotoria. Em pouco mais de 15 minutos de conversa, o promotor afirmou que o projeto de instalação apresentada itens que ferem a legislação ambiental, conforme parecer técnico emitido pelo Gabinete de Assessoramento Técnico do Ministério Público (GAT). Segundo Stéfano, o empenho é máximo da promotoria para resolver a questão, bem como por parte dos empresários Pedro Bocchese e Eduardo Rubini. Afirma que na próxima segunda-feira, 07 de maio, está marcada uma reunião na sede da procuradoria Geral de Justiça, em Porto Alegre, com os empreendedores, município de Antônio Prado, técnicos do Centro de Apoio do Meio Ambiente, GAT e promotoria, afim de debater os itens a serem modificados.  


Confira a entrevista com o Dr. Stéfano. Após encontra-se transcrito partes do parecer técnico emitido pelo GAT, no dia 12 de março.


Dr. o que levou ao MP a verificar as obras da FAP?
Chegou até nós uma notícia informal sobre a construção da FAP, de que naquele local de declividade acessiva, haveria corte de grande número de araucárias e a presença de recurso hídrico, o que tornaria aquele imóvel Área de Preservação Permanente, segundo a nossa legislação, mais especificamente o Código Florestal.

De imediato perante a grandiosidade da obra e da possível gravidade da notícia, fomos ao local e verificamos realmente que havia araucárias já cortadas de grande porte, e que o terreno não parecia ser propício para a obra. Como chovia muito, não adentremos ao terreno e não percebemos a existência do curso de água. Diante disso, solicitei algumas informações sobre os responsáveis pelo empreendimento e que o município me informasse se havia declaração de interesse social ou de interesse público para a fim de instalação da FAP.

Vieram as informações e realmente os documentos revelaram a existência de uma área de preservação permanente e de imediato o que me chamou a atenção foi a metragem a ser protegida da APP, que não condizia com a metragem legal. Dizia que a área não edificante era de 10 metros para cada lado, quando a legislação estabelece 30 metros para cada lado. Isso já me deixou apreensivo e um bom indicativo de que a área não seria realmente propícia para aquele tipo de empreendimento.


O Sr. havia dado 10 dias para dar um retorno sobre a questão. Mas até essa data houve ou não retorno aos empresários?


Inicialmente não havia a instalação de inquérito civil, pois não tínhamos provas de algo ilícito, nesse caso de natureza ambiental de uma área que não deveria estar sendo usada e que seria objeto de ocupação futura.

Foi estabelecido um acordo informal em conversa com os responsáveis pela FAP, que consistia em mandar imediatamente para o Gabinete de Assessoramento Técnico do Ministério Público de Porto Alegre o projeto para análise, que em tese10 dias seriam possível, visto o pedido de urgência. Passou um pouco, pois não consegui mandar no primeiro dia, mas em duas semanas haviam me retornado afirmando a existência de uma APP. Assim, aquele projeto não poderia ser implantado como estava.

Tudo isso ocorreu em acordo informal, pois os empreendedores ficaram sabendo que havia essa irregularidade, então nós ajustamos informalmente esse prazo.

O que houve posteriormente é que eles foram cientificados/informados do laudo elaborado pelo GAT identificando as irregularidades no local.

A partir daí os empresários entregaram uma defesa/uma contra argumentação com relação ao laudo da assessoria técnica e essa argumentação foi submetida novamente a análise da assessoria técnica. O retorno veio durante o período de férias e está eletronicamente disponível, confirmando novamente a existência de uma situação que impede a instalação da FAP naquele local.


O que embaralha a continuação da obra são somente questões ambientais. Houve falha nas emissões das licenças de instalação da obra? 
O aspecto é relativamente técnico ambiental. Até me pareceu que o município de Antônio Prado, ao declarar interesse público aquela área, não o fez enveredado pelo melhor caminho, mas a questão básica, é problema ambiental.


Houve negligência do Município ao emitir a declaração de interesse público?
É difícil avaliar, segundo a própria informação do GAT não haveria hipótese estrito censo de declaração de interesse público. Mas eles não entraram mais profundamente nessa questão, pois a questão principal é a ambiental. Todo esse inquérito civil, e acabo de responder a Câmara de Vereadores, ele é de natureza pública, está disponível a qualquer pessoa, não houve decreto de sigilo e nenhum momento. O que há é uma questão pública de preservação ambiental que não foi rigorosamente observada quando da expedição da licença de operação e do projeto que esbara na legislação ambiental.

Os empresários deverão adequar o projeto a legislação para seguir adiante?
Hoje pela manhã (03-05-2018) ainda conversei com o Coordenador do Centro de Apoio ao Meio Ambiente, colega Daniel Martini, que está em contato permanente com o GAT, e afirmou que vai ser necessária a reformulação parcial do projeto, tal qual apresentando, não tem viabilidade de implantação. E já ficou marcado uma reunião para segunda, dia 07 de maio, às 15h30min, na sede da procuradoria Geral de Justiça, em Porto Alegre, onde já foram comunicados os empreendedores e o município de Antônio Prado para participarem dessa reunião junto com o Centro de Apoio do Meio Ambiente, GAT e comigo. Alguns aspectos poderão ser compensados de alguma maneira para viabilizar o projeto, mas há alguns aspectos que, tal qual como está, o projeto não poderá ser implantado.


 Como vê a mobilização da comunidade com abaixo assinado, solicitação de pedido pela câmara de Vereadores?
É importante a manifestação da população, mas não poderei eu ir contra a legislação, estaria indo contra meu próprio trabalho. Quero deixar claro que a promotoria em momento algum é contra a construção e sabemos quão importante é para a comunidade a construção desse empreendimento. 



 Mapa apresentado pelos próprios Empreendedores que afirma a existência de um CÓRREGO que passa pelo meio do terreno, fato esse confirmado pelos Pareceres Técnicos do GAT.




Pontos apresentados no Parecer técnico emitido pelo GAT em 12 de março de 2018. 

Trechos a seguir foram retirados do parecer PARECER TÉCNICO - DOCUMENTO UAA No 0234/2018 - UNIDADE DE ASSESSORAMENTO AMBIENTAL - ÁREAS PROTEGIDAS – APP/MARGEM DE CORPO D’ÁGUA – remetido ao promotor Dr. Stéfano Lobato Kaltbach. 

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Histórico do processo

A Notícia de Fato 05/2018 trata de Denúncia sobre extração de mata nativa e araucárias para a construção da sede da Faculdade de Antônio Prado. Foi realizada vistoria pelo Promotor de Justiça e pela Secretária de Diligências no local.

Em 28/02/2018 o processo foi encaminhado ao Gabinete de Assessoramento Técnico para avaliação e resposta...

Constatações da vistoria realizada:
 
 A vistoria realizada pela Unidade de Assessoramento Ambiental em 02/03/2018 foi acompanhada pela Secretaria de Diligências Valérie Giacomini Pinheiro, pelo proprietário do empreendimento Eduardo Rubini e pelo vereador Rodrigo Cordeiro. Após o início da vistoria compareceram no local o Prefeito de Antônio Prado, Juarez Santinon e o Vice-Prefeito Carlos De Nardi. No final da vistoria compareceu no local Pedro Bochese, proprietário do empreendimento. A área já havia sido submetida a intervenção, com supressão de vegetação e movimentação de terra (parcial). Havia no local resíduos vegetais de parte das supressões realizadas, e as toras originadas pela supressão de araucárias permaneciam depositadas junto à área. O curso d’água existente no terreno, de pequena largura e águas límpidas, ainda não havia sido canalizado/fechado, estando sua APP impactada em função das intervenções para supressão de vegetação e da movimentação de terra. Junto à via pública estava depositada tubulação (tubos de 1 metro de comprimento, 60 cm de diâmetro) para canalização do curso d’água. ”


(Documento segue com descrição técnica sobre problemas referente a canalização do curso d’água e possíveis problemas ambientais e urbanos, além de apresentar problemas técnicos no projeto apresentado. )

“Resposta aos quesitos formulados pelo promotor que se encontram no parecer técnico;

a) Verificação se a Licença Ambiental (LP) expedida pelo Município de Antônio Prado está de acordo com a legislação ambiental vigente, os quais eventuais irregularidades podem ser constatadas.

Do ponto de vista de dispositivos legais vigentes, a análise da Unidade de Assessoramento Ambiental centrou-se nos dispositivos definidos nas leis no 11.428/06, quanto à proteção do Bioma Mata Atlântica, e no 12.651/12, quanto à existência de área de preservação permanente no imóvel investigado. Apesar de estarem atendidos os dispositivos previstos na Lei no 11.428/06 quanto à supressão de vegetação, avaliou-se que a atividade pretendida não se enquadra nas hipóteses previstas na Lei 12.651/12 para intervenção em área de preservação permanente, não sendo passível de licenciamento na forma como foi realizado.

Além disso, conforme amplamente discutido no presente documento, inexiste justificativa técnica para a canalização de curso d’água pretendida. Destaca-se ainda que não houve licenciamento e avaliação específica para a canalização do curso d’água (se existisse justificativa), sendo que a autorização para implantação desta atividade considerada de alto potencial poluidor foi deferida no âmbito de licenças ambientais emitidas para atividade de baixo potencial poluidor (escola/creche).



b) Se é hipótese concreta da Declaração de Utilidade Social da área licenciada.
O Decreto Municipal no 972, de 25/09/2017, declara de interesse social, para os fins de obras essenciais de infraestrutura, destinadas à instalação da Faculdade Antônio Prado – FAP/RS, uma faixa de terreno com área de 11.475,00m2, considerando, entre outros, a essencialidade das obras para o desenvolvimento educacional no município e a inexistência de alternativa técnica locacional, para a implantação das obras.

Não foi apresentado estudo que comprove a inexistência de alternativa técnica e locacional do empreendimento. A Lei 12.651/12 define como de interesse social “a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais consolidadas, observadas as condições estabelecidas nesta Lei”. De acordo com a avaliação realizada no item 2.3.2 do presente documento, a atividade pretendida não corresponde ou equipara- se ao que é previsto na referida lei, não sendo hipótese concreta, sob a avaliação técnica de competência desta Unidade de Assessoramento Ambiental, de declaração de interesse social.



c) Se o Licenciamento Ambiental atingiu Área de Preservação Permamente - APP.

O licenciamento ambiental atingiu área de preservação permanente caracterizada pela presença de curso d’água no imóvel.


d) Se o córrego existente no local pode ser canalizado.

De acordo com a avaliação realizada pela Unidade de Assessoramento Ambiental, inexiste justificativa técnica para canalização do curso d’água. Não é uma medida tecnicamente adequada tanto do ponto de vista ambiental como urbanístico.



e) Qual a distância que deve ser observada como APP às margens do córrego existente no local.

Considerando que o curso d’água apresenta largura inferior a 10 metros, a área de preservação permanente corresponde a faixas de 30 metros a partir das margens do curso d’água.



f) Se a espécie "Araucária angustifólia" pode ser cortada. Caso possível, qual a medida compensatória adequada.

A supressão de Araucária angustifólia atende os critérios e limitações estabelecidos na Lei no 11.428/06. De acordo com a legislação estadual a compensação pela supressão da espécie deve ocorrer na forma de plantio de 15 exemplares da mesma espécie para cada exemplar suprimido. O art. 14 da Lei Estadual no 9.519/92 proíbe o abate da Araucária angustifólia em floresta nativa com diâmetro inferior a 40 centímetros à altura de 1,30 metros do solo. De acordo com o levantamento apresentado, 40 exemplares que tiveram supressão autorizada apresentavam diâmetro inferior a 40 cm.


g) Qual o prejuízo ambiental estimado na hipótese de ser constatada alguma irregularidade.

O prejuízo ambiental resultante da canalização prevista do curso d’água e intervenção em área de preservação permanente foi amplamente discutido ao longo do presente documento.


h) Qual a declividade existente na área licenciada pelo Município de Antônio Prado.
De acordo com medições realizadas em vistoria não foram constatadas declividades superiores a 30° no terreno. As medições realizadas por meio de aparelho eletrônico in loco, porém, permitem uma avaliação geral da área investigada e não possibilitam realizar uma avaliação conclusiva. De acordo com informação técnica apresentada no processo, não incide na área declividade superior a 30o.


i) Se houve a supressão de vegetação nativa.

Houve supressão da supressão nativa existente na área, inclusive atingindo exemplares de pinheiro-brasileiro (Araucária angustifólia).


j) Qual o grau de impacto ambiental do empreendimento.

O empreendimento pretendido na área investigada tem alto grau de impacto ambiental na medida em que prevê canalização de curso d’água e intervenção em área de preservação permanente.


k) Outros aspectos que os técnicos entendem pertinentes e relevantes ao caso concreto.

Em relação a geração de esgotos sanitários, a norma ABNT NBR 7229/1993 estabelece para escolas, a contribuição de 50 litros por pessoa por dia. Consta no Parecer Técnico para emissão da LI, que o empreendimento irá gerar 1,90 m3 /dia. Tal volume, equivalente ao atendimento de 38 pessoas, pode ser considerado irrisório para o porte do empreendimento. Assim, observa-se que não está demonstrado o atendimento do Art. 7o da Resolução CONSEMA no 355/2017 (pág. 3 do Parecer Técnico – item 1 – quanto aos efluentes gerados).

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